quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Meu bicho papão imaginário

Conta-se entre tantas experiências ligadas a infância de alguém, a fase em que a criança inventa um amigo imaginário e em todas as suas experiências partilha com o tal amigo os acontecidos e as brincadeiras. Conta-se também, desta fase da vida, sobre o medo do bicho papão ao apagar das luzes à hora de dormir. Em ambos os casos, o Tempo exerce enorme bondade   e leva tais medos consigo no caminhar dos dias (ou os troca por outros!). Porém a mim, este senhor das horas parece ter escolhido para um pregar de peça. Nem cultivei o amigo imaginário, nem matei meu bicho papão. Ao contrário: adquiri um bicho papão imaginário. Dos mais maldosos que se poderia inventar, este noturno “companheiro” em voz cínica e ensurdecedora vive a tirar-me o sono com uma simples palavrinha: incompetência.   Você é incompetente, ele me diz. Você é insegura e por isso é incompetente, argumenta. O maldito até conseguiu operar boas mudanças em meu comportamento. Passei a ser pontual, acordar cedo, ser mais organizada... Mas... Como eu disse, temos aqui um bicho papão e não um amigo imaginário crítico.  Certa vez Satre levantou a importância em alguém ter projetos, ou a opção de ter projetos para sua vida. Estar envolvido em um projeto pessoal.  

E o que acontece quando estamos fora da escolha? Acontece perdição. Pra onde ir quando parece estar no lugar errado, com as pessoas erradas, na hora errada? Eu vos digo: achamo-nos O Erro. Não saber se o otimismo alheio é que é besta, ou se eu é que sou invejosa da competência alheia.  Não saber se sou insegura, ou se o que classifico como atitude segura é sancionada por outros como violência/indolência. A perdição de todos os limites da justa medida. A paralisia das idéias.

Sigo assim alçada de qualquer tipo de projeção de futuro. E toda noite meu bicho papão imaginário. A molestar-me, a colocar toda a fragilidade humana exposta a meus olhos. Toda a fragilidade que tanto me esforço em esquecer quando a luz do dia e o barulho dos carros competentemente cumprem sua importante finalidade: ensurdecerem-me ao que realmente  me é humano.  Às vezes, me questiono se tais questões são o que me paralisam, ou o que realmente deveriam me mover. Se os demais fingem não temerem tais angustias, ou se realmente não as tem... Infelizmente, só o bondoso Tempo poderá me ajudar no diálogo com o meu bicho papão.