sábado, 27 de novembro de 2021

Pena de mim?

 Algumas pessoas, muitas, na verdade, ao me conhecerem, agradecem a Deus por não ser eu. 

Eu já provei pelo menos uns 4 tipos de orgasmo diferentes mesmo com menos dedos. E já havia comprado meu primeiro imóvel aos 30 anos de idade, ganhando menos no mercado de trabalho. 


Assediada por 80% dos boy sem deficiência, criei meu filho sem homem na responsabilidade comigo. Terminei os estudos antes que uma boa parte das pessoas sem deficiência, vinda de família pobre. 


Eu achei por muito tempo que eu deveria ter inveja de pessoas com seis dedos a mais do que eu.


Hoje eu estou fracassando na carreira, na compra da casa e nos estudos e acho que é o que todo mundo está fazendo independente da quantidade de dedos.


Só que agora eu conheço mais uns 6 tipos de orgasmo.  Entre eles 

escrever e fazer pirraça. 


As pessoas não deviam sentir culpa por ter pena de mim.


Eu já sinto culpa por ter tido pena de mim por eu mesma. 

E eu não sinto culpa por ter pena das pessoas sem deficiência. 


Só gostaria que sentissem de pena de mim com os motivos certos: 

que é eu não conseguir mostrar o dedo do meio porque não tenho. E por não conseguir assoviar. 


Eu sinto pena de vocês por não conseguirem mostrar o dedo do meio quando isso é necessário. 

Também sinto pena quando deixam de dançar por acharem que dançam mal.  E quando acham que o prazer de vocês depende das mãos de outras pessoas.   


Ah, também sinto pena por terem unhas esquisitas, 

sendo sincera.

terça-feira, 19 de outubro de 2021

Quem eu serei em seis anos

Eu queria ser essa que eu sou hoje só que há seis anos atrás. Para evitar os problemas que eu tenho hoje. Só que é exatamente os erros desses seis anos o quê me formou em ser quem eu sou. É um paradoxo. 


Eu queria ter dito que eu poderia ser solidária com quem fosse, mas não com minha casa. A casa é minha extensão de corpo, ser solidária parece ter sido esconder o medo de eu ficar a sós com esse corpo. 


Eu morei com algumas pessoas, quase todas sem deficiência física. A casa nunca esteve tão limpa quanto por mim. Eu achava que eu precisava das pessoas para isso acontecer.


Gostaria de ter me perguntado há seis anos atrás porque eu deixo a imagem de uma incapacidade que eu nem testei me fazer acreditar que todos em minha volta podem fazer coisas a mais do que eu.


Eu queria saber naquela época é que minha imagem às pessoas importa sim. Mas o quanto eu preciso investir em mim para sobreviver?

É verdade que ser uma pessoa com deficiência demanda mais gastos, no meu caso. Porque eu lembro o dia em que eu caí na rua e por ser uma pessoa com deficiência me deixaram no chão. Na chuva.  

Pessoa com deficiência física é pedinte se está no chão. E pedinte quando pede ajuda, pode ser ignorado. 

Saber quem sou no mundo e saber que essa narrativa não é minha me faz planejar o quanto eu quero investir para não sofrer violência. Para ter minha voz respeitada. E em quê eu quero colocar dinheiro e energia para isso acontecer.

Eu queria saber naquela época que meu consumismo é fruto do medo de ficar no chão na rua de novo 

E não uma loucura da minha cabeça.


Queria me avisar naquela época a segurar minha ansiedade em ter de dar conta de urgências alheias. Urgências essas que dava conta por achar que preciso mais das pessoas do que elas de mim.  


As pessoas me dizem há muito tempo para eu aguentar coisas que só eu darei conta.  

Eu queria saber, há seis anos atrás, que as coisas dão errado. E as pessoas escondem que deram errado. Elas não aguentam necessariamente. E que eu posso errar e eu posso voltar atrás mesmo em grandes escolhas.

Há pouco tempo, duas pessoas me culparam por eu ter feito o que elas mesmas aconselharam. As falas foram de que eu não fiz do "modo certo". Bom, se eu relutava em fazer, era porque não me sentia preparada. Em um dos casos, o que deu certo posteriormente foi fruto do meu primeiro erro.


Talvez eu não seja uma mulher de "meios termos", mas use esse lugar como defesa

um lugar de ponderações que

eu não preciso fazer

nem agora

nem há seis anos atrás. 

há seis anos atrás.



É só um relato para alguma Outra-Eu, que esteja na fase do que eu era, 

há seis anos atrás

e para os próximos seis anos.


quinta-feira, 15 de julho de 2021

Ejaculação precoce

Vez ou outra vem na cabeça fazer uns versinhos

Só para levar os boy pra cama

Na lábia

Pelos dedos...


O problema é que mal começo 

a escrever

já começo a gozar.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Degustação de tintos

 A tudo merecerei se estiver 

atenta.

Se estiver AQUI.

***

(mas como 

não ter medo

da gula sabendo que o mais sábio

dos deuses foi também

aquele que comeu 

os próprios filhos,

o Tempo?)


Se ainda é doloroso

mastigar minhas memórias

é também um banquete 

eu sei

sentir você em minhas fibras:


Somos D.E.l.I.C.I.O.S.O.S

Decifro-me e devoro-te.





 




quinta-feira, 18 de março de 2021

"Será que ela não se enxerga?"

Pode o subalterno não se sentir subalterno?


Pode o subalterno desejar? Por inteiro?

Pode o subalterno sentir por inteiro?

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Sentir números

 Olhar o corpo de uma ideia, foi a primeira vez que vi materializada minha ansiedade. E ela fala em línguas. Números.


Abrir uma planilha e sentir. Não existe linguagem lógica. Os números ali desenhavam meus dias escorrendo em juros.


Amortizações decrescentes juros bebendo em meu pescoço e reproduzindo como células de um câncer. 


A minha ansiedade têm dentes feitos zeros arredondados, mas afiados. Que se escondem por trás de siglas. Abreviações que expandiram a  zero a esquerda que eu me sentia.  Como quem ficou pra trás depois de cansar de nadar.

.

.

Por isso, sinto tanta falta de ar.

Estava me afogando pelas bordas do sonho de uma casa própria.