quinta-feira, 26 de abril de 2012

Aguâncias

II

No início

 o horizonte

belo e distante

nítido

como a luz e a escuridão

os contornos cheios de certeza

o coração sempre em linha reta

***

Depois

A  vida em enxurrada

fecundação

em meu útero

a fórceps

este estado de mulher

E então

os sonhos nublados

os desejos 

desde ali

borrões

  ***

Choveu

Placentas inteiras

encharcaram-me todas as certezas

mofações fertilizadas

um dilúvio

a terra abrindo-me com os dentes

exigindo o seu retorno ao meu ventre

um parto ao avesso

contrações eternas  

abortanças compulsórias

um rastro de ilusões pelo caminho

  *** 

agora

apenas

acalentar as frustrações

para que não acordem.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Perfurações íntimas

III

Coloquei tudo em uma mala

Decidida a nos incendiar

Eu tinha muitas escolhas

Desamar violentamente

Ou

Despedaçar  uma a uma

nossas lembranças

Fomos sociopatas profissionais

barbarismos cotidianos

Eu te rasguei muitas vezes

mas a carne decepada foi a minha

Choveu

Você não soube

de raiva eu te omiti

Houve tempestades

Vendavais

Mas em cada palavra minha

O fel aos pingos

 A dor a conta gotas

Em cada dor,

Novos  oceanos

Pari para dentro

Um amor ao contrário

e a cada nascimento

agüentar calada

Rebentar as visceras

Flagelei todas as nossas memórias

e agora

carrego só

essa enxurrada de afetos mutilados

À espera

de um dia de sol.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Pontos finais contínuos

Os amores terminam. 
O problema é que não terminamos junto com eles. 
E temos de continuar, apesar de. 

terça-feira, 17 de abril de 2012

Dialética dos pássaros

As pupilas piscam em ritmo pré-estabelecido

Esterilizamos  as pedrinhas que catávamos pelo chão

E as coisas passaram a ser exatamente o que são

O corrimão, antes para trepar

Agora, somente em nosso ancoro

E cada vez mais corrimões

O mercado das almas bambas está aquecido

...

Hoje foi o primeiro dia

Ensinar os olhos

A enxergar  os pássaros

enquanto a cidade segue

Em sua barbaridade cinza.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Letra trouxa

Eu queria tanto ser escritora,

Tanto, tanto, tanto!

Daí eu seria chamada de poeta

A Poeta!

Poderia ser paga como poeta,

Admirada como poeta,

E é claro,

Comida como poeta.

 

 

Mas...

No meio do caminho

tropeço

a

maldita

crônica e chula

do peito

daninha

Flor roxa

desta trouxa

cheinha de letras mutiladas

membros fantasmas

em cinza de ideias

os sentimentos bambos

 

Da poesia

somente o gauchismo

 No meio do caminho

Glaudica um espinho

Sem rima nem fé

manca,manca, manca!

 

 Carne-in core-recta

Core  filhosdaputadocaralho

Carne -caústica

Letra soda

Palavra vazia não pára em pé

 

Nas mãos que faltam dedos

A cabeça empanturrada

de Letra frouxa