quarta-feira, 23 de setembro de 2015

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Eu sou também o meu silêncio. Cinquenta por cento de. Mas o trabalho, a TV, as lojas, os formulários e a ansiedade dos afetos, todos os dias, tentam cooptar essa parte de mim. Tentam me impor, tentam me seduzir, tentam me coagir. E criam buracos movediços para que eu preencha com os cadáveres de meus anseios. Enfiam comerciais nos intervalos. Instigam meu ego a falar repetições vazias.   A escrever verborragia. A xingar pelo silêncio que me tomaram, capturando assim duas vezes aquilo que só obteriam uma: o silencio roubado e o silêncio do luto desse silêncio . Para tudo, rapidamente, a obrigação de um exato posicionamento. Sem contemplação e freios. E eu caio na armadilha. E depois tento preencher o que nunca caberia preenchimento. Com lindos vestidos, gritos esganados, afazeres atulhados, noites mal dormidas. Frágeis ilusões, placebos, unguentos, invenções anoréxicas apesar de destemidas.  Porém, uma hora a noite chega. E quando se está só em um quarto escuro com o corpo em repouso e os olhos estalados, não há como fugir: eu sou também o silêncio barulhento  que na noite me devora. Síndrome do pânico, ansiedade, fadiga, cansaço... muitos nomes difamatórios para apontar inocentes e pontuais cobradores que em um horário seguro de minha presença aparecem para somente retirar o que lhes é direito: nem mais nem menos, os cinquenta por cento do que não estou sendo.  Somente aquilo que me devo. Nem mais. Só menos.
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segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Pedido descabido



Entenda, por favor
Quantas mãos rudes você acha que eu suportaria antes de apelar?
Se era uma cilada finalmente conhecer a fina sensação do toque de uma cápsula inflamada
Não me culpe
Se em ti fugia da aspereza
 não querer  nunca mais experimentar

E como não querer-te?
Se era lento o tempo de um flerte finalmente delicado
E que há tanto procurava
Por favor, não me culpe
Se em você fiz moradia viciada
Em fuga
Pelo quê de violência
não queria mais em mim reencontrar

Pois só contigo aprendi a ser malva e lago e larga e funda
Como ter certeza de em outros toques haver também essa humanidade?
Meu corpo cansado de enganos
Retesado se aprisionou
na fotografia de um pretérito imperfeito
e enclausurado e hipnotizado pelo que se soube teso
Forjou inteiro
Memórias, falas, dramas, esquinas premeditadamente visitadas
Qualquer coisa que escapava
Pelo medo de em nenhum outro encontro
Conseguir se  frequentar

Não me culpe, por favor
 Se te uso de desculpa
E ainda se te culpo pela armadura
Que por minha própria escolha
Despi para conseguir a você tocar
Que se o uso sente que te anula
Não se preocupe
O uso é para mim
Para pela pele ter algo realmente nervo
Em acreditar
Justo você que em tantas se desvia
Compreensão eu gostaria
Apesar da loucura em se debater o que não foi nem seria
Entenda, por favor
Quantas mãos rudes você acha que eu suportaria antes de apelar?  

sábado, 12 de setembro de 2015

E nada espero dos que me querem bem

O lugar de quem espera

O lugar de quem espera. De quem é flexível. De quem se mobiliza em direção ao outro, pois sabe que esse outro não se moverá por você. O lugar de quem depende. O lugar de quem é deixado sem nenhuma certeza. O lugar de quem está disponível. O lugar de quem necessita. O lugar de quem pode ser deixado de lado a qualquer momento por qualquer outra pessoa, evento e, pior, por qualquer outra COISA. O lugar de quem abre o tempo com as mãos e, de pulsos quebrados, vê o outro jogar essa pequena e importante fresta  de resistência… no lixo. O lugar de quem não tem ninguém participando de sua vida, pois é a a programação do OUTRO, a genialidade do OUTRO a única capaz de gerar boas sugestões de experiência. O lugar de quem a palavra em si e toda a memória que comporta nada dizem e importam. O lugar de quem não tem títulos a altura ou não fala tão devidamente abstrato. 

O lugar do abstrato, suspensão, do ser içado:

O lugar da angustia. 
Angustia… 
Da ansiedade.

de quem está a mercê de ponteiros que se movem tão rápido que aos olhos humanos acabam por sempre estar no mesmo lugar. 
O lugar de quem tem de ser a que se compara. De quem é repetidamente convidada a se colocar em questão de maneira histérica e vazia. O lugar de quem não participa, mas limpa o salão ao final da festa. E que deveria agradecer a Deus pelos restos de doces que fora autorizada a degustar. 
O lugar sem nome. 
Sem temporalidade. 
Sem corpo 
(comparações sem sentido só descorporoficam). 
Sem história. 
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O não-lugar.     
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É sutil. Minar sua auto estima pelo que compromete do seu tempo. Pelo que dúvida de sua fala.
Pelo que analisa (dividir em partes) publicamente de seu corpo. 

O cansaço e aflição da espera.

A solidão. 

O aceitar qualquer quase afago para resistir e esse congelamento do tempo.

E novamente a espera. 

A espera.
A espera.
A espera.
A espera.

O não-lugar.

!

RECUSA.

: O meu tempo sou eu.

E eu não vou negociar.