quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

TPM. Assim mesmo, bem clichê!

É inescapável. Um dia eu teria de escrever sobre isso: TPM. Puta que pariu!!! Não é para “causar” ou fazer firulas de retórica enchendo o texto de palavrões, mas é que esse momento de existir em algumas de nós mulheres tem conseqüências surreais.

Como que a contração de um órgãozinho desse naipe, em exercício saudável de sua existência, pode reverberar de maneira tão incisiva não somente em nosso corpo, como também em nosso sentimento de mundo?! Como diria a Sonia, cadê o botão de liga/desliga? E o inferno são os outros!

As pessoas respiram perto de mim. Que I-RRI-TAN-TE!!! AHAHAHAHAHAHA!!!

A desse mês está ainda pior: tudo me comove. A mãe que perdeu a filha de quatro anos assassinada, o mendigo da rua, a novela, o sol, o mar (ou a falta dele!), o cocô do cachorro, o respirar das pessoas...Ontem foi sem motivo mesmo!

O pior é que estou sem meu filho, sem dinheiro para sair a algum lugar que me faça esquecer isso e com trezentos textos da Berbel para a prova de sexta. Eureca! Devem ser aqueles textos que me fazem chorar...rsrsrs. Não são. Odeio dipirona!

Sabe o que é engraçado? É que durante o dia, exceto pelas cólicas e pela ansiedade, fica tudo bem. Quando chego ao meu apartamento, mesmo vazio, também continuo bem. Mas quando apago a luz para dormir, eis que a maldita TPM, igual ao monstro do armário dos temores de quando criança, sobe devagarzinho, pelos dedos dos pés, até alcançar o cangote. E em um arrepio de lembranças já geladas, o travesseiro fica molhado. Aí, como não tem dipirona que resolva dor de melancolia, fico lá, deitada, puta da vida pelas horas de sono desperdiçadas, a espera do fim da tempestade.

É estranho demais quando não entendemos tão descaradamente a nós mesmos. Dá um quê de sentimento de vulnerabilidade. Dá vontade de que tenha alguém ali, junto, para ficar acordado comigo também, compartilhando do meu emputecimento em traços de Alvarez de Azevedo (egoísta né? Eu sei!). Alguém de quem eu não tivesse vergonha de chorar em sua frente. Uma vontade do alguém impossível (já que só choro à vontade agarrada ao meu ursinho!). Alguém com paciência para ouvir a tristeza de minhas obviedades...                 

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Esconde e mostra

Inicio esta conversinha comigo mesma neste desdiário – sim, porque se a idéia do diário é a de esconder confidências e aqui às revelo, não poderia ter outra denominação senão esta – a fim de, não como prometido ( a mim mesma!), rebater alguns pontos do texto anterior, mas desviar o nível da conversa e falar sobre coisas mais amenas...trivialidades.

Após um longo período de sapateamentos e chiliques dos mais diferentes espécimes, eis um momento anestésico em que o prazer e a ociosidade finalmente se fazem presentes (mesmo que rapidamente!) nesta vidinha de meu Deus. E assim, como em o diário íntimo de Laura, da Clarice Lispector, cantarei este monólogo em tom menor, com as notas de meus “sentimentozinhos”, de minhas “ideiazinhas”. Venho, digo, seguirei pela dinâmica sanguínea que só o álcool emprega às idéias dilatadas em prazer de perversão.

E foi após uma frustrada tentativa de passeio cultural a uma apresentação de Choro no CCBB, centro de São Paulo, que seguimos viajem rumo a, como diria um colega, taberna de Satanás. Fizemos pouso na Prainha Paulistana. Estávamos em quatro: três mulheres e um rapaz, um grupinho de amigos já consolidado da turma de lingüística.

Demos inicio a peleja e quando já encharcados por alguns gramas de álcool, observei que assim como nossos corpos, a conversa também ganhava leveza, proporcionalidade medida em quantidade e qualidade das risadas.

Havia alguns segredos. Alguns doces segredos...e a parcimônia empregou a estes guardados saberes a doçura de guloseimas ainda mais refinadas. Neste patamar da conversa foi percebi a realização de um jogo de esconde e mostra que naquele momento se colocava a mim de maneira evidente. Quando o nosso querer se contrapõe ao nosso dever de forma que se rompermos contrato com o segundo sejamos levianos consigo mesmos, então articulamos formas de satisfazer este querer de outras maneiras. Contextualizarei já que não quero que seja uma regra universal.

Em certo momento da conversa, queríamos, levados pelos efeitos cremosos dos blaks que tomamos, revelar acontecimentos, impressões, curiosidades, etc que não poderiam ser reveladas por qualquer motivo de origem aleatória. Ou por restrições de ordem moral, ou por envolver pessoas que não devessem ser envolvidas, ou por expor além da medida detalhes de nossa intimidade. Tudo se tornava ainda mais interessante, pelo caráter dos participantes da roda, quatro lingüistas: uma analista de discurso (quer dizer, futura, já que minha pós tem inicio apenas no meio deste ano), uma filósofa da linguagem, dois sintaxicistas.  Aos poucos revelávamos muito (senão tudo) o que tínhamos vontade. Até porque, o próprio movimento de esconder já quer demonstrar alguma coisa. E todos ali sabíamos disso. E usávamos. E sabíamos que estávamos a usar.

Todas as vezes que quero convidar certo amigo a ir a minha casa, início um assunto qualquer, banal, por msn. Como ele é uma pessoa, como se diz popularmente, direta,  acaba por desmascarar a minha empreitada. Quando dou inicio a conversa já sei que ele vai fazer isso. Sempre o faz. E ainda sim sempre levo a conversa do mesmo modo. E ele sabe que farei isso sempre e se diverte à custa da minha polidez extremada. E eu à custa da forma direta com que me revela.

O mecanismo inverso, embora semelhante, era operado por nós naquela mesa de bar. Um strepptease conversacional. 

E quem sabe, um strepptease como o que talvez esteja sendo realizado agora...

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Viver em casas de vidro

Rating:★★★★★
Category:Books
Genre: Biographies & Memoirs
Author:Por Paula Sibilia
"Big Brother", webcams e blogs abrem frestas na intimidade, complicando a velha separação público-privado


Já virou rotina: quando a TV Globo dá a conhecer os participantes de cada nova edição do "Big Brother Brasil", anuncia-se uma enxurrada de informações e imagens a respeito de tudo o que acontece “na casa” do reality-show -e, muito especialmente, acerca de tudo o que ali não acontece.
Mas não se trata de um caso isolado. “Aparecer me faz feliz, não o faço por dinheiro”, conta uma adolescente que publica suas fotos eróticas em um blog. “Ainda nem consigo acreditar que os rapazes falam de mim”, diz a garota emocionada, aludindo aos comentários que recebe de seus espectadores na Internet. “É como ter fãs!”, resume orgulhosa. “Passo o dia inteiro no computador do meu quarto”, explica outra menina de 13 anos. “Tenho 650 contatos no MSN, com os quais converso o dia inteiro, além disso, tenho três fotologs pessoais, onde publico minhas fotos e escrevo sobre minha vida.”
Essas ânsias de exibição em todas as telas dão conta de certo clima de época. “Muitos jovens não parecem ter instintos de proteção da privacidade”, justificou um especialista ao avaliar os lucros bilionários que o MySpace -um desses sites onde os adolescentes despejam boa parte de suas vidas- prevê abocanhar com seu envio de publicidade direcionada. Um novo sistema que visa a orientar os anúncios em função dos dados supostamente privados dos usuários, porém ostensivamente divulgados por eles próprios em seus blogs, perfis e conversas on-line.
É curioso, nestas épocas de condomínios fechados e pânico pela (in)segurança: estes jovens parecem “viver em casas de vidro, não por trás de cortinas de renda ou de veludo”, como constatava David Riesman em seu livro "A Multidão Solitária". Publicado originalmente em 1950, trata-se de um estudo sociológico sobre a “transformação do caráter” que teria ocorrido nesse momento histórico: um deslocamento dos eixos em torno dos quais cada sujeito edifica o que é. Um deslizamento de “dentro” de si (introdirigido) para “fora”, ou melhor: para tudo aquilo que os outros podem enxergar (alterdirigido).
Essa segunda modalidade de auto-estilização já não se assenta na densa base da própria “vida interior”, como costumava ocorrer nas sociedades ocidentais ao longo do século XIX e nos inícios do XX. Em vez disso, o novo tipo de personalidade investe todas suas munições nas aparências: aposta todas suas fichas nos efeitos que o próprio aspecto físico pode provocar nos outros.
O modo de vida e os valores privilegiados pelo capitalismo em auge teriam sido primordiais nessa transição, propiciando as habilidades de autopromoção em cada indivíduo e suscitando um verdadeiro “mercado de personalidades”, no qual a imagem pessoal é o principal valor de troca.
Riesman explica que “os americanos sempre procuraram uma opinião favorável, e sempre tiveram que procurá-la em um mercado instável, onde as cotações do eu poderiam cambiar, sem a restrição de preços de um sistema de castas ou de uma aristocracia”1.
No entanto, apesar dessa tradição já cimentada pelo percurso nacional tão característico do "american way of life", foi somente em meados do século XX que ocorreu esta genuína “redefinição do eu”. O novo rebento é, acima de tudo, uma subjetividade que “deseja ser amada”, que busca desesperadamente a aprovação alheia, e para tanto procura tecer contatos e relações íntimas com os outros.
Não é casual que, 60 anos depois da enunciação daquela tese pelo sociólogo norte-americano, mais da metade dos adolescentes daquele país possuam blogs, fotologs e outras ferramentas para a exposição de si na internet, sem nenhuma inquietude com relação à defesa da própria privacidade -e nem a de seus amigos, inimigos, parentes e colegas que também costumam habitar suas confissões audiovisuais.
Em um aparente retorno aos modos de vida nas zonas rurais e pequenos vilarejos prévios à urbanização do Ocidente, nesta “aldeia global” do século XXI é impossível preservar os segredos. Aqui, porém, o anonimato pode ser útil, mas a discrição não constitui um dos valores mais prezados. Ao contrário, até: nas vitrines virtuais do ciberespaço, a mera possibilidade de passar despercebido é o pior dos pesadelos.
Pois, independentemente da quantidade de espectadores que de fato consigam recrutar, os adeptos dos coruscantes recursos da Web 2.0 costumam pensar que seu presunçoso eu tem o direito de possuir uma audiência. E a ela se dirigem todos os dias com seus relatos, fotos e vídeos de tom intimista e cotidiano, onde o protagonista exclusivo é sempre o mesmo: eu. Faz sentido, pois no império das subjetividades alterdirigidas, tudo o que se é deve ser visto para poder realmente ser, e cada um é aquilo que mostra de si.
Ecoam, aqui, alguns ecos longínquos que vale a pena trazer à tona. Há muito tempo, no outono de 1928, Virginia Woolf foi convidada para ministrar uma série de conferências sobre “a mulher e o romance” em duas instituições universitárias "for ladies" -pois as outras, as boas, na época ainda eram restritas aos "gentlemen". A escritora aproveitou a ocasião para tentar responder, longa e belamente, a uma pergunta: por que as mulheres não tinham escrito, até então e salvo pouquíssimas exceções, bons romances?
Eis uma síntese da resposta: porque não tinham um quarto próprio. Faltava-lhes um espaço privado, uma habitação exclusiva para elas, onde teriam podido ficar a sós. Por isso, pelo menos até então, tudo tinha sido infinitamente mais complicado para as mulheres. “Em primeiro lugar” porque, para elas, “até os inícios do século XIX, ter um quarto próprio, para não falar de um ambiente realmente tranqüilo e sem barulho, era inconcebível”2.
A resposta é justíssima, embora o diagnóstico não deixe de ser correto também para a maioria dos homens, pelo menos até algum tempo antes da data assinalada pela romancista inglesa. “No século XVI era raro que alguém tivesse um quarto só para ele”, explica Witold Rybczynski, em seu livro sobre a história da casa.
Seria necessário aguardar mais de cem anos ainda, até bem avançado o século XVII e iniciado o XVIII, para que começassem a aparecer “os ambientes nos quais era possível se retirar da visão do público”3. Mas a noção de que tais quartos deviam ser confortáveis e silenciosos só apareceria no século XVIII; pelo menos, para os homens mais afortunados.
De todo modo, a defasagem aludida por Virginia Woolf implicou uma enorme desvantagem para as damas, pois o âmbito privado logo se impôs como um requisito fundamental para que o eu do morador pudesse “ficar à vontade”. Sozinha e a sós consigo mesma, a subjetividade moderna podia se expandir sem reservas e se auto-afirmar em sua individualidade.
Naqueles tempos em que a escritora britânica erguia sua voz, tão inflamada como majestosa, esse espaço da privacidade já tinha assumido um papel primordial. Era necessário dispor de um recinto próprio, separado do mundo público e da intromissão de outrem por sólidos muros e portas fechadas, não apenas para poder se tornar uma boa escritora, mas também para poder ser alguém: para se tornar um sujeito, para ter condições de produzir a própria subjetividade, um “modo de ser” obviamente introdirigido.
Além de constituir um requisito básico para o desenvolvimento do eu, o ambiente privado também era o cenário onde transcorria a intimidade. E era nesses espaços onde se engendravam, em pleno auge da cultura burguesa, os relatos de si: as cartas e os diários tradicionais, todas essas “escritas intimas” que proliferaram no século XIX e que deram vazão ao furor de “deciframento de si” que tomou conta de homens, mulheres e crianças da época4.
Para escrever esses textos confessionais, o autor devia estar a sós. Demandavam, também, uma distância espacial e temporal com relação ao destinatário das cartas e aos eventuais leitores dos diários. Estes últimos, aliás, só tinham acesso aos textos após a morte do autor, caso este fosse alguém excepcional, capaz de despertar o interesse póstumo dos possíveis leitores.
As atuais versões cibernéticas dessas escritas de si, por sua vez, também costumam ser práticas solitárias, embora seu estatuto seja bem mais ambíguo, porque se instalam no limiar da publicidade total. A tela de nossos computadores não é tão sólida e opaca como os muros dos antigos quartos próprios. Além disso, a distância espacial e temporal com relação aos leitores tem encolhido sensivelmente: agora tudo acontece na vertigem do tempo real.
Para compreender essas mutações, é preciso considerara que a separação público-privado é uma invenção histórica e datada, uma convenção que em outras culturas não existe e, entre nós, é bastante recente. A esfera da privacidade só ganhou consistência na Europa dos séculos XVIII e XIX, ecoando o desenvolvimento das sociedades industriais modernas e do modo de vida urbano.
Foi precisamente nessa época que um espaço de “refúgio” para o indivíduo começou a se construir entre quatro paredes, no seio do mundo burguês, fornecendo a estes novos sujeitos aquilo que tanto almejavam: um território a salvo das exigências e perigos do clima público das ruas.
Todo esse aconchego estava ausente das habitações medievais, com suas moradias nas quais todos compartilhavam quase tudo. Entre os estímulos para fundar essa cisão público-privado, e para a gradativa expansão deste última esfera em demérito da primeira, figuram vários fatores: a instituição da família nuclear burguesa, a separação entre o espaço-tempo do trabalho e o da vida cotidiana, além dos novos ideais de conforto, domesticidade e intimidade. É significativo que hoje tudo isso esteja em crise -e, provavelmente, também em mutação- como insinuam tanto a casa do "Big Brother" como os espaços virtuais onde os jovens adoram mergulhar.
Naqueles tempos remotos, porém, foi um desses fatores -a paulatina aparição de um “mundo interno” do indivíduo- o detonante para que o lar se tornasse um sitio adequado ao acolhimento dessa vida interior, que já brotava com todo o vigor e que logo iria florescer. Assim, as casas foram se tornando lugares privados, e se definiram funções específicas e fixas para os diversos cômodos, aparecendo inclusive “um quarto mais íntimo para atividades privadas como a escrita”5. Sobretudo, é claro, para a escrita de cartas e diários.
De preferência, esse aposento gloriosamente individual estaria situado no coração de uma confortável casa burguesa, mas seu caráter não mudaria se fosse um pequeno quarto alugado em uma pensão qualquer. Como frisara Virginia Woolf, o importante era que se tratasse de “um alojamento independente, por miserável que ele for”. Pois somente nesse cubículo fechado e isolado do mundo, seu morador poderia ficar à vontade, a salvo não apenas do barulho das ruas e “das cobranças e tiranias de suas famílias”, podendo então se concentrar em sua obra -caso se tratasse de um escritor ou uma escritora- e em seu eu finamente introdirigido.
Assim, em contraposição ao protocolo hostil da vida pública, o lar foi se transformando no território da autenticidade e da verdade: um refúgio onde o eu se sentia resguardado, um abrigo onde era permitido ser si mesmo.
A solidão, que na Idade Média tinha sido um estado raro e não necessariamente apetecível, converteu-se em um verdadeiro objeto de desejo. Pois apenas entre essas paredes “próprias” era possível desdobrar um conjunto de prazeres até então inéditos e agora vitais, ao resguardo dos olhares intrusos e sob o império austero do decoro burguês. Somente ali era possível desfrutar do deleite (e do labor) de estar consigo mesmo.
Foi assim como se configuraram, no despontar da Modernidade, dois âmbitos claramente delimitados: o espaço público e o privado, cada um com suas funções, regras e rituais que deviam ser prudentemente respeitados. E foi também assim como germinou um tipo de subjetividade particular, dotada de um atributo muito especial: “interioridade psicológica”. Nesse cerne vagamente localizado dentro de si, fermentavam pensamentos e sentimentos privados. Esse repertório afetivo merecia todos os cuidados: devia ser cultivado, sondado e enriquecido constantemente.
É por isso que alguns autores se referem a essa criatura como Homo psychologicus. Um tipo de sujeito que, como afirma Benilton Bezerra Jr., “aprendeu a organizar sua experiência em torno de um eixo situado no centro de sua vida interior”6. Eis o caráter introdirigido, cuja mutação analisara David Riesman: um tipo de subjetividade voltada para dentro de si, que portanto deve se abrigar “por trás de cortinas de renda ou de veludo”, longe da indiscrição das janelas de vidro e das câmeras de TV, ou mesmo das mais modestas webcams.
1 - RIESMAN, David. "A Multidão Solitária". São Paulo: Ed. Perspectiva, 1995; p. 34.



2 - WOOLF, Virginia. "Un Cuarto Propio y Otros Ensayos". Buenos Aires: A-Z Editora, 1993; p.72.



3 - RYBCZYNSKI, Witold. "La Casa: Historia de una Idea". Buenos Aires: Emece, 1991; p. 29.



4 - CORBIN, Alain; PERROT, Michelle. “El Secreto del Individuo”. In: ARIÈS, Philippe; DUBY, Georges. "Historia de la Vida Privada", v. 8. Madri: Taurus, 1991. p. 161-162.



5 - RYBCZYNSKI, op. cit.; p. 53.



6 - BEZERRA, Benilton. “O Ocaso da Interioridade e suas Repercussões Sobre a Clínica”. In: PLASTINO (org.). "Transgressões". Rio: Contra Capa, 2002; p. 229-239.


Fonte da imagem: http://faxinamental.blogspot.com/

Lapiolino

http://lapiolino.wordpress.com/
De onde eu imitei o "Do que"

Diário Dócil

http://diariodocil.blogspot.com/
Com certeza muito mais interessante que o meu!

Daquilo que espero estar completamente errada...

Hoje acordei com uma borbulhação de apetecimentos. Um incômodo de existir que já não é de agora, mas que hoje exigiu vez e voz. Fato incomum já que me fazer pegar na lida já pela manhã, é realmente de uma proeza sem tamanho.

Acordei pensando na velhice. Desde escrevi o texto para o Gironda Jacobina sobre o senhor Gambé e a relação que estabelece com sua sexualidade, com o dinheiro e principalmente da relação que estabeleci com tudo isso, desde que parei para pensar também na mulher deste senhor, coisa que fiz apenas no momento de escrita do texto, o meu sentimento com relação à velhice mudou de sensação. Transformou-se em medo. Um medo que a muito eu já conseguira ter banido.

Sempre tive muito medo da morte. Parece óbvio, mas esse temor não era igual ao que todos sentem já por instinto e normalidade. Chegava mesmo a me tirar o sono. Recortou minha própria ideologia já que acredito em Deus, pura e simplesmente por não aceitar a idéia de deixar de existir. Aliás, mais do que isso, o que provavelmente depois de alguma reflexão eu talvez conseguisse superar, a idéia da morte de meu pai e de minha avó nunca chegou e nem chegará a fazer parte de meus objetivos.

Mas o veneno da mordida estava em uma relação funesta que eu fazia e isso sim, fruto do senso comum, entre a velhice e a morte. Era uma apreensão de velhice como o inicio de uma cadaverização gradual e desprovida de qualquer misericórdia. Porém, o tempo passa e à medida que detemos o nosso olhar com um pouco mais de cuidado e atenção percebemos os mecanismos dessa máquina de gente que é o senso comum. O mundo quer roubar nossa subjetividade!!! E temos, ou pelo menos, eu creio ter, de lutar contra essa carnificina conceitual.

Aos poucos reformulei o meu parâmetro de beleza e de estética. Uma reformulação que já era fruto de uma outra feita alguns anos antes com relação a minha própria condição: a de deficiente física. O resultado, talvez um pouco “polianesco”, é a conclusão de que as pessoas não têm asas e nem por isso se consideram deficientes físicas! Discordando um pouco de Hannah Arendt, que diz que o nosso corpo é uma prisão, creio que exceto pelas masélas de saúde, é a idéia de corpo que carregamos o que nos aprisiona. Quando nos enquadramos dentro de um rótulo ou ainda, de uma idealização é exatamente aí que nos desumanizamos. Ao nos introduzirmos dentro de armaduras de ferro de esteriótipos como o do “deficiente físico coitado” ou mesmo o de “lutador”, do “quarentão amargurado”, da “gorda feiosa”, etc, é aí que a fudição de cabeça inicia o estraçalhamento de nossa humanidade. O mundo quer roubar nossa subjetividade...

Eu me lembro de uma das aulas da Norma Discini, professora de Análise do Discurso, em que relatava de certa vez em uma festa, ao encontrar uma amiga que a muito não conversava, eis que esta lhe disse: “Nossa, mas porquê você não tira esse bigode chinês?”. Ela relatou que até aquele momento nunca havia reparado que possuía um bigode chinês e que a partir do ocorrido, toda vez que se olhava ao espelho, o maldito bigode estava lá, pronto para ser depilado! Realmente...o mundo é imanência!

A partir daí, tentei estender minha “desesclassificação” de conceitos também às relações feitas com as pessoas que me rodeiam. Um processo gradual, que encontrava resistência na “prova dos nove” do nunca conseguir ficar com ninguém muito mais velho do que eu. Sabe aquelas pessoas que dizem “eu não tenho preconceito, mas não ficaria com um negro!”. Pois bem, quando quero tirar a prova faço a mesma relação. Mas ao fim, consegui. O tempo para certas coisas é santo remédio!

Agora, depois de toda essa historinha, sabe qual é o motivo do meu medo? É que toda essa sofrida reestruturação do olhar foi feita por mim e não para mim. Eu um dia vou envelhecer e aí me vêm os calafrios. Mesmo os homens mais inteligentes que já conheci, retirando-lhes o verniz do discurso politicamente correto, preferem uma linda moça à uma linda senhora. Até porque é completamente possível encontrar o mesmo grau de inteligência e conhecimento em uma mulher de 25, como, por exemplo, a Sonia, minha amiga, e uma mulher de quarenta. Os homens querem ser “gostados” por sua inteligência, mas não abrem mão de uma “gostosinha” à tira colo. Filhos da puta!!!

A questão é: não há como lutar com isso. O silêncio recorta o dizer. Antes de eu abrir a boca, serei uma coitada deficiente física e velha. Independente de eu achar que não sou.

Se minha beleza física reside em minha aparência de ultra jovialidade (ou alguém acha que sou inocente em achar que deixamos de ser uma sociedade preconceituosa e os homens caem aos meus pés porque superaram o preconceito com pessoas com deficiência física???) o que vai acontecer quando essa jovialidade for embora?

Não há como fazer sexo sozinha. Inevitavelmente, nesse ponto, somos totalmente dependentes do olhar do “outro”. Certa vez, uma amiga me disse que o que chama a atenção de todos é que não me comporto como a coitada que esperariam encontrar. Tomara apenas mesmo que seja apenas uma questão de postura e que minha análise esteja completamente errada. Porque, se não for...Medo. Muito medo!                

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Da maldade necessária

Olá querido blog! Quanto tempo!!!

Faz um bom período que não escrevo nenhuma de minhas aporrinhações de viver neste espaço. Talvez tenha ficado mais difícil de escrever depois que soube que tem mais desocupados do que eu imaginava freqüentando os dejetos das minhocas que ocupam esta minha cabecinha. Putz, está difícil de começar!!!

Escreverei assim sob o teto da ilusão de estar falando sozinha. Fica mais fácil já que, por enquanto, somos apenas eu, o Word e os meus fones de ouvido .

Há algum tempo que algumas de minhas ações me emperram a felicidade de viver. Mais que sentimentos, eu classificaria, à luz do que refleti no meu curto período de férias, um instinto nefasto. É o que apelidei de “minha bondade inerente”. Tentarei ser mais clara.

Certa vez, ao assistir um dos Cafés Filosóficos da Cultura, vi um psicólogo palestrando sobre relações amorosas de servidão. Seriam relações em que necessariamente houvesse um dominador e um dominado. O “malzinho” que abusa da bondade de seu companheiro ultra-bonzinho o qual perdoa a tudo com a tolerância em que nem Jesus perdoaria.

Ao contrário do que se poderia supor, o professor esclarece o quanto este tipo de relação extremista também era conveniente ao protagonista da história: “o bonzinho”. Segundo sua análise, é sempre mais fácil estabelecer comparação moral com quem te abusa, à se responsabilizar por seus desejos  e suas maldades. É também prazeroso de pensar “Nossa! Como eu sou bonzinho! Como eu sou caridoso! Como seu ou tolerante! Como eu sou superior!!!Como eu sou....como sou!!!”

Eu não acredito em ex-católico. Uma vez católico, católico sempre!!! Comecei a pensar que essa minha bondade irritante é um daqueles resquícios do cristianismo que ficam na gente mesmo quando já o tenhamos abandonado. No meu caso, uma bondade besta!

Mas, Graças a Deus, o diabo é que é bom de cama! Eu sou maldosa...bem maldosa!!! Maldosa, Graças a Deus!

É com esse sentimento de perversidade que eu cheguei a uma postura já defendida pela personagem Luisa, do Érico Veríssimo: bondoso, todos conseguem ser. Difícil é ser maldoso!!! Eu parafrasearia como: bondade em demasiado é...irritante!!!

A maldade é necessária! Ou pelo menos, em certos momentos me convém...e deve ser assumida sem culpa! Enquanto socorria minha amiga Sonia de um ataque alérgico, sentimentos muito maldosos me apeteceram de diversas maneiras. Não com relação a ela, mas com relação ao “anjo de candura” que me ajudava a socorrê-la. Como aquele ser me irritou. Tive culpa por alguns instantes. Mas aí, eis que veio a redenção...

O desgraçado que tão servilmente ajudava a socorrer minha amiga não parava de falar asneiras um minuto sequer. Aquelas frases de apoio, aquela imbecialização paternalista. Para citar apenas uma de suas pérolas, em certa altura dos acontecimentos eis que o "ser" me defende que, estando ele em condição de homem, não fazia mais que a obrigação em proteger duas (sim, porque mesmo eu não sendo vitima de nenhum acometimento, acabei por me tornar uma por extensão!) meninas indefesas e a perigo do mundo. Quase estraçalhei sua massa encefálica ao me ORDENAR que subisse a calçada ao invés de andar pela rua.

Talvez esse meu sentimento de ódio seja calcado pelo desejo de punição, um outro lado da moeda dos mesmos resquícios de meu cristianismo cujo um bom paralelo seria o mesmo instinto que fez com que os "bondosos" sacerdotes enviassem seus opositores pagãos às fogueiras da inquisição. Mas viva a licença poética que reside no delicioso respaldo da palavra “talvez”!

Creio ter me empolgado com a idéia e descarrilado a critica do texto. Mas o que pretendo com uma mudança de postura como essa é me retirar, e deixo claro que sou eu mesma o objeto e o agente da ação, do pedestal em que me amarrei. Peneirar minha passividade. Ter coragem de desapontar aos simulacros que me impõem; ter coragem de desapontar as expectativas decorrentes de tais simulacros. Não ser o que esperavam de mim e ainda não me sentir culpada por isso.