quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Esconde e mostra

Inicio esta conversinha comigo mesma neste desdiário – sim, porque se a idéia do diário é a de esconder confidências e aqui às revelo, não poderia ter outra denominação senão esta – a fim de, não como prometido ( a mim mesma!), rebater alguns pontos do texto anterior, mas desviar o nível da conversa e falar sobre coisas mais amenas...trivialidades.

Após um longo período de sapateamentos e chiliques dos mais diferentes espécimes, eis um momento anestésico em que o prazer e a ociosidade finalmente se fazem presentes (mesmo que rapidamente!) nesta vidinha de meu Deus. E assim, como em o diário íntimo de Laura, da Clarice Lispector, cantarei este monólogo em tom menor, com as notas de meus “sentimentozinhos”, de minhas “ideiazinhas”. Venho, digo, seguirei pela dinâmica sanguínea que só o álcool emprega às idéias dilatadas em prazer de perversão.

E foi após uma frustrada tentativa de passeio cultural a uma apresentação de Choro no CCBB, centro de São Paulo, que seguimos viajem rumo a, como diria um colega, taberna de Satanás. Fizemos pouso na Prainha Paulistana. Estávamos em quatro: três mulheres e um rapaz, um grupinho de amigos já consolidado da turma de lingüística.

Demos inicio a peleja e quando já encharcados por alguns gramas de álcool, observei que assim como nossos corpos, a conversa também ganhava leveza, proporcionalidade medida em quantidade e qualidade das risadas.

Havia alguns segredos. Alguns doces segredos...e a parcimônia empregou a estes guardados saberes a doçura de guloseimas ainda mais refinadas. Neste patamar da conversa foi percebi a realização de um jogo de esconde e mostra que naquele momento se colocava a mim de maneira evidente. Quando o nosso querer se contrapõe ao nosso dever de forma que se rompermos contrato com o segundo sejamos levianos consigo mesmos, então articulamos formas de satisfazer este querer de outras maneiras. Contextualizarei já que não quero que seja uma regra universal.

Em certo momento da conversa, queríamos, levados pelos efeitos cremosos dos blaks que tomamos, revelar acontecimentos, impressões, curiosidades, etc que não poderiam ser reveladas por qualquer motivo de origem aleatória. Ou por restrições de ordem moral, ou por envolver pessoas que não devessem ser envolvidas, ou por expor além da medida detalhes de nossa intimidade. Tudo se tornava ainda mais interessante, pelo caráter dos participantes da roda, quatro lingüistas: uma analista de discurso (quer dizer, futura, já que minha pós tem inicio apenas no meio deste ano), uma filósofa da linguagem, dois sintaxicistas.  Aos poucos revelávamos muito (senão tudo) o que tínhamos vontade. Até porque, o próprio movimento de esconder já quer demonstrar alguma coisa. E todos ali sabíamos disso. E usávamos. E sabíamos que estávamos a usar.

Todas as vezes que quero convidar certo amigo a ir a minha casa, início um assunto qualquer, banal, por msn. Como ele é uma pessoa, como se diz popularmente, direta,  acaba por desmascarar a minha empreitada. Quando dou inicio a conversa já sei que ele vai fazer isso. Sempre o faz. E ainda sim sempre levo a conversa do mesmo modo. E ele sabe que farei isso sempre e se diverte à custa da minha polidez extremada. E eu à custa da forma direta com que me revela.

O mecanismo inverso, embora semelhante, era operado por nós naquela mesa de bar. Um strepptease conversacional. 

E quem sabe, um strepptease como o que talvez esteja sendo realizado agora...

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