segunda-feira, 29 de outubro de 2012

MAIS

Menos um,

menos dois,

menos três...


Os dedos desnecessários nas minhas, 

necessários apenas nas suas.


Menos é mais.



E você  nunca me empresta as suas


Você as usa em mim!


Mais um,

mais dois,

mais três…

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

"Em frangalhos"

Nunca mais eu acordei. Desde o dia 20 de março de 2006 eu passei, colocando à parte as raras exceções, a ser sempre “acordada”. Nunca mais dormir até a hora desejada. Com o tempo, um pouco de compreensão e um pouco de aporrinhação. Todos os dias ser acordada: sábado, domingo, feriado, dia útil e inútil. Acordada como mãe, como pai, como trabalhadora e como estudante. E não há como culpar a Ele. Mas o irracional é uma merda.
Já perdi as contas de quantas vezes à hora do levantar eu disse a Gabriel coisas que não se diz nem a um adulto de 50 anos de idade. Depois, pedir desculpas, remoer-se, lembrar da negligência das demais pessoas que também deviriam junto a mim velar o sono do meu pequeno e o meu. Lembrar que elas também não têm culpa, que o sistema é excludente, que não considera nem velhos, nem crianças, nem mães e male-male as mulheres. Lembrar que eu sou responsável por meus atos, que eu devo ser racional, que Ele é importante. Eu juro, juro mesmo que estou tentando. E em boa parte das vezes eu consigo. Todavia, os sentimentos não são uma estatística. Merda!
E o meu sono é pesado e tenso. Às vezes, visita-me em sonho com uma maldita psicóloga que fala sobre a solidão de meu filho. Indefeso diante de minhas grosserias. E Ele tão paciente com meus recorrentes pedidos de desculpas. Nos sonhos, ou pesadelos, que seja, não o protejo. Os sonhos se repetem e eu continuo a fingir que está tudo bem. E as coisas não estão mal. Apenas não estão todas bem como eu gosto de acreditar.
Eu estou cansada. As pessoas não entendem e, talvez, não devam. Eu estou cansada delas também. Cansada de algumas mais do que de outras. Principalmente das que insistem em me fornecer suas picuinhas diárias. Estou cansada das mediocridades alheias. Das pequenezas, das fofocas, das vozes atrás das paredes. Dos cochichos, do meu medo de ser assunto de toda essa sujeira. Vozes de dor, eu sei.  Nem por isso, sinto-as menos tontas.  Vozes de gente que sente dor e esta, por sua vez, fez delas pessoas tontas. Medo de ficar tonta com a presenciação das tontezas alheias e da passividade diante das minhas.
Um consolo, pois eu corro atrás de consolo também. O meu é pensar que algo de certo devo estar acertando com Ele: é uma criança fantástica. Porém e daí? Se o tempo que temos juntos é desperdiçado em sermões, pedidos de silêncio, videogame, pedidos pra deixar-me dormir, explicações sobre o meu cansaço. Explicações-inexplicáveis sobre o meu incompreensível cansaço. O Tempo. Que se vai. Junto com o que realmente importa.  E leva a infância de meu filho pra longe de mim.
Deixo claro: isso é um lamúrio. Ninguém pode me ajudar, ou quem pode, não quer. Não é um pedido de socorro. A vida não está péssima e nem o meu pequeno está mal. Somente acredito que é preciso fazer este rascunho de uma das consequências de nosso tempo, de nossa sociedade.  Isso aqui é só para registrar. Quando as futuras gerações remontarem a história de nossa intimidade, quero que saibam o quanto este maldito sistema de trabalho e de estudos causam dor.   Sobre o que é estar fora. E para sublinhar que estar fora não tem nada de genético ou a ver com força de vontade.
Aliás, a minha está se reerguendo. Com deslizes. Que doem.  É isso.     

terça-feira, 9 de outubro de 2012

“É de um mundo em frangalhos, não obstante em calmo desespero..."

“É de um mundo em frangalhos, não obstante em calmo desespero, que seu pequeno grande salto se dá. É de um mundo miserável, em sua opulência fútil, que seu pequeno grande corpo emite seus sinais. Sinais de dor, tão somente e tanto.”

Fonte: O Estado de São Paulo. 


Link: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,o-calmo-desespero-das-elites,941550,0.htm


Alguns textos felizmente ou infelizmente não passam intactos aos nossos corações, ou não nos deixam intactos, enfim. O trecho acima é o de um deles. Ao final deste relato, entenderão. Espero. O entendimento da autora talvez não anteceda a tempo para que o vosso possa ocorrer.    

Nos últimos dias tenho sido irresponsavelmente consumista. Ainda não quebrei a barreira do imponderável, mas estou muito próximo disso. Nos últimos dias tenho comido chocolate delirantemente. E trabalhado e estudado na mesma proporção. E tenho sido absolutamente estupida com meu filho. Estou há um dia de um maldito processo seletivo, que de seleção faz muito pouco. Apenas tira fora a quem o sistema não suporta. Ponto. Agora, tentarei amarrar todos esses fios. Amarrados, porém, sinto muito, ainda emaranhados.

O que me tocou no texto acima: colocar meu filho, por alguns instantes, no lugar da criança que cometeu o suicidio no colégio São Bento. Dramático demais, lógico. Gabriel não estuda em colégios-formadores-de- vencedores. Não almejo um filho vencedor em relação a “perdedores”, mas em solidariedade com os últimos. Entretanto, talvez por uma analogia rasteira, enxerguei algo que se põe diante de meu nariz: um sistema que me distância de meu filho. E o faz colocando-me  eternamente em débito com sei lá o quê, no qual as tarefas sempre estarão acima do necessário. Colocando-me sempre em atraso com trezentos mil deveres e em estado de stress permanente em relação à pessoa mais importante da minha vida.

A pergunta que eu me fiz ao ler o texto foi sobre quais sentimentos e angustias Gabriel estaria a carregar sozinho e indefeso ao ouvir todas as minhas grosserias?  Por quê me refugio no consumismo como forma de aplacar a ansiedade que me consome diante do medo da “derrota”?

Eu tenho uma lista de angustias. A respeito do maldito mestrado que só consome os anos da minha vida e da minha relação maternal e parece cada vez mais nada me devolver. Das horas a fio que ficamos em escritórios enquanto nossos filhos, parentes e amigos adoecem sós em algum canto da cidade. Do repentino apego a um hábito consumista. Da falta de dinheiro, seja economizando, seja consumindo (será isso?). 

Eu escrevo tudo isso calmamente, assim como aparece no texto citado. Não há desespero, ou, se há, ele é calmo. Eu não consigo responder a tudo isso. Mas precisarei.