terça-feira, 16 de setembro de 2008

Relatos tardios

Era uma vez uma vontade de história...
Como aquelas com o cheiro de terra molhada
Cheiro do quintal de minha avó...
Onde tatus-bola constroem castelos invisíveis em algum tijolo misterioso
E o tempo passa devagar...
E eu não alcanço a fechadura da porta e tenho medo de subir no muro
Um muro muito gigante!
Infinito...
Mas que tenho certeza
Que, lá de cima, finalmente, eu teria a revelação de uma casa,
Casa caverna cuja porta é um buraco por onde somente crianças passam
E tudo nela é de luz e de botões
e de refrigerante e de chocolate e de coxinhas!
Era uma vez a língua das árvores e das flores
Era uma vez borboletas que não mais fogem de minhas mãos
(Sussurro)
“os vaga-lumes as convenceram de que também sou borboleta
com azas invisíveis e que moro em um jardim de amoreiras”.
Era uma vez uma história que trouxesse as coisas para o seu tamanho real
Em que tudo é tão longe e tão maior do que eu...
E, novamente, a sorveteria da minha casa é o melhor lugar do mundo!
Era uma vez um lugar em eu que só usaria rosa-cor-de-mamão
Mesmo o mamão sendo de outra cor
E os ladrões usam pedaços de pau como armas
E é só dizer “vivi” para desmorrer no mesmo instante
Nela, eu comerei ovo cozido com a gema mole,
Ouvindo minha avó cantar suas músicas estranhas
enquanto lava a louça do café
Teria uns dez filhinhos
Porque todos eram gatinhos
E não mais teria preguiça
Nem de trabalhar!
Porque seria cada dia uma coisa:
Um dia professora,
Outro dia bailarina,
Outro, policial,
E outro, uma mãezinha,
Era uma vez...
Então, minha avó viria me cobrir
E segurar as minhas mãos com suas mãos quentinhas
E os vaga-lumes que escondi no bolso
Viriam outra vez me levar
E eu, borboleta,
voltaria voando ao misterioso Castelo dos Tatus-Bola
em algum tijolo misterioso
de uma memória muito estranha,
(lembrança que se esquece)
mas que acorda no escuro do quarto
enquanto rezo,
com as mãos geladas
e o mesmo medo do escuro.

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