quarta-feira, 13 de junho de 2012

Solo

Eu pensei em escrever sobre as coisas que sinto. Sobre carnes desformes e almas espelhadas em convexo . Sobre gritos que escorrem pelas mãos e que ninguém vê. Sobre ter a sombra aos pedaços e os medos inteiriços. Sobre isso de nunca enxergar-se. Sobre santificarem-te morta enquanto empalham-te viva. Sobre mover-se rio, enquanto todos são mar. Sobre mãos que envergonham-se de tocar e ainda sim tocam. Sobre um útero que ninguém via. Sobre uma vagina que fingi-me não ser. Sobre ser fera e bela em um mesmo corpo. Sobre ser agridoce. Pensei em citar nomes e guetos, e ícones, e músicas, e bantos, e batidas, e histórias de gentes minhas de outras gerações. E procurar alguma Angela Davis, algum dos Panteras Negras ou ler algum Craveirinha que finalmente nomeasse o que sou. Pensei. Não escrevi. Meu silêncio é solitário. Palavra em amnesia não enxerga.   


Carne que se fez linguagem. Eu sou dislexia. A minha carne não toca jazzes, nem blues, nem sambas, nem faz poemas . Terei de inaugurar este novo grito dos olhos.


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