segunda-feira, 11 de maio de 2009

A outra metade de meus textos...continuação

A cada dia que passa, reforça-me mais a idéia de que somos seres delineados por uma imanente contradição. É o melhor e o pior de nós. Alguns passam a vida a investigar suas contradições e a verossimilhanças de suas idéias. Outros a querer impô-las aos demais. Talvez, na realidade, sejamos um misto de ambos.

Como a proposta deste espaço é o desossar de minha hipocrisia, penso em, na medida do possível, expor minhas contradições ao impulso de impô-las.

A primeira e não recente conclusão é a que defendi acima: ser contraditória é o melhor e o pior de mim. O pior, na medida em que expõe a demagogia e a fragilidade de meus argumentos, de minhas idéias e a mesquinhez de meus sentimentos. O melhor, pois graças a essa característica tenho a facilidade em abandonar idéias apaixonadas e mentirosas, idéias e sentimentos preconceituosos e discriminadores, em mover as categorias e os quadros nas paredes que sustentam os meus pensamentozinhos. Mas mover as idéias, mover as ações e mover os sentimentos são três ações distintas, embora entrelaçadas. Pois não temos acesso a fatos, mas apenas a pontos de vista. Ações distintas... Com um mesmo alvo. A demagogia, óbvio, emerge da contradição das direções entre elas. Dificulta ainda a liquidez de minhas certezas e os malditos paradoxos, os quais nem sempre estou atenta.

Estes dias, a navegar entre meus blogs prediletos, me vi diante de uma das frases de Clarice Lispector a qual não tenho mais acesso na integra, mas da qual me ficou “a moral da história”. Clarice coloca que escrever não é apenas um ato de reflexão sobre o mundo, mas condição mesma para se pensar. A autora diz só conseguir se pensar no ato da escrita. Nisto, talvez eu seja como ela. Daí eu temer o silêncio. O silencio das idéias... Obviamente, não há grandeza proporcional entre o resultado do ato de escrita de Clarice e o meu. Mas creio ser preciso amar a vida, mesmo que seja a minha. Ando alienando-me de mim. O problema disso, antes que se levante a bandeira de humildade, é que nisso me desapego do mundo. O resultado parece ser um enorme sentimento de tédio. Como se na luta diária entre a passividade de meu temperamento e a rebeldia de minhas idéias, a contradição ficasse um fardo cada vez maior a carregar. Aliás, eis uma contradição que não consigo resolver: a demagogia de meus atos e o medo das minhas palavras. Como amar a vida se já não me satisfaço com a que tenho? “Mesmo que seja a minha”... Amar a vida porque ela é minha. É a responsabilidade da vida o que parece  que me escapar às mãos.

Por estes dias decidi que para continuar a pensar-me com mais sinceridade  fechar alguns de meus (futuros) posts. Medo. Sim, um medo que não consigo vencer. Não tenho acesso a quem lê este espaço. Não há medidores de audiência no blog. Assim,  mantenho o compromisso de sinceridade e aviso que coloco  alguns conteúdos para balanço. Contraditório? Lógico!...rsrsrs!

 

Fonte da imagem: http://lordevelho.blogspot.com/2008/07/partes.html 

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Quase dois sambas

A outra metade de meus textos...

Dois sambas e nenhuma melodia.

Sorry pela mediocridade das letras, mas não sou poeta e nem musicista. Apenas uma grande intrometida. Como diria o meu amor, em paráfrase a uma frase do texto de Raduan Nassar, uma lingüístazinha de merda.

Mas se não faço sambas bons, é que estou me guardando para quando o carnaval chegar... 

 

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Samba sem endereço

Meu nego diz que é branco

Que é quase carcamano

Que é da Leopoldina

E que na minha favelinha

Prefere nem pisar.

Meu nego que é branco

Que se acha carcamano

Despejado da mordomia

Diz que só se mudou lá da vilinha

Que é pra não entediar.

Meu branco diz que é preto

Mas que é preto do Bexiga

E que não se junta com gentinha

Que é pra não acostumar.

Meu nego não tem cama,

Não tem mesa, não tem grana

Mas diz com voz de galo empapado

Que não é em barraco alagado

Que ele há de me amar.

Meu nego não tem cor

Não tem diploma de dotô

Não tem beira, não tem eira

Não tem carro, nem cavalo

Mas diz que em endereço favelado

Ele não vai me procurar

O meu nego que não é preto

Nasceu num bairro de operário

Em épocas de glória foi proletário

Mas hoje acha de classe só palavrear

Meu nego fala bonito, Fala difícil

Diz que é branco letrado

E que não vai pro trabalho

Que é pra inteligência não gastar

Diz que é vagabundo de classe

Que pra favela só iria se o pagasse

Mas na hora do amorzinho

A favela não quer largar

O meu branco quer ser preto

Às vezes se acha o literato

E encarna o próprio Machado

Que de preto aos poucos passou a clarear

O branquinho que é o meu nego

Esnobou minha favela,

- Tem gente chucra e sem cultura!

É difícil de chegar

Mas esse branco que é meu nego

Que não banca e só faz trela

É apenas mais um desses malandros de subúrbio

Que de samba não quer gostar

O que o nego num percebe

É que o de menos é meu “CEPE”

Que a favela mora em mim

E o meu amor é feito assim

De samba sem hora e sem lugar

Ele é a minha favela fazendo batuque

E é feito no ritmo da cama fazendo compasso

Ele é o samba sonhando o terreiro em que vai tocar. 

 

 

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(Sem título)

 

Dizem por aí que sou muito é descarada, pois o corpo ainda nem esfriara

E eu tão logo viuvinha

Já me fiz faceirinha pro velório ir paquerar,

Mas o que todos não sabem

é que rancor de mulher traída

só se cura mesmo é com saia curta e com birita...

e mais ainda

com muita danação

Pois só eu sei quanta brasa engoli

Que da amante maldita à boca dele cuspia

as cinzas de nossa paixão

É que por um teco de cigarro, esse desgraçado,

quis me deixar no celibato

com lamento e sem pensão

E se foi.

Com a querida fedida

A traiçoeira, magrela e nem mesmo faceira,

E quem lhe era sempre a preferida

Ingrato! Ingrato!

Eu ali, queimando em paixão,

Trocada por um cinzeiro roubado!

Ingrato!

E o maravilhoso perfume

de nicotina!Da querida... fedida!

Fedida e barata,

que a todo tempo lhe escarrava a desgraça,

a asfixia de nossa canção.

Ingrato!

E agora, que suas brasas o consumiram,

Pois eu é quem pergunto a todos esses ditos amigos

Quem é que consumirá

As brasas que eu estava guardar

e o Amor que estava a lhe juntar, enquanto ele?

Tudo num cinzeiro a nos fumar!

Ingrato!

Há isso é que não há perdão!

E é por isso que eu afirmo

E em compasso de samba de viúva empoleirada

Que por chumbo trocado e cinzeiro derramado

Não se fica a chorar e não se reclama por limpar.


quarta-feira, 25 de março de 2009

Respostas copiadas

Na ausencia completa de criatividade, o mundo me pensa com minhas palavras mesmo sendo de outros...O grifo é meu. A não minha resposta , mas ainda sim minha.

situacional

- onde estás?
- aí.
- como estás?
- bem, aqui;
- como te sentes?
- preso entre o que não sei, o que sei que não tenho e o que não sou.
- o que posso dizer? ou fazer?
- emenda-te, que eu, já não tenho espaço nem tempo, se não para ser o que sou.

Texto chupinado do blog: http://tempusatempus.blogs.sapo.pt/

quinta-feira, 5 de março de 2009

quarta-feira, 4 de março de 2009

As meias palavras e as meias verdades

Olá querido e abandonado diário, quanto tempo!

E é sempre assim, não é mesmo?! Todas as vezes que minhas idéias freiam, é a este tom e à cumplicidade do diálogo o que me resta das migalhas de minha criatividade. Em alguns textos atrás, me reportei como causa de minha inatividade, a uma possível preguiça das idéias. Mas passados alguns meses, desconfio de que após o período de “preguiça”, o que me sucede, além do caráter de urgência de meu dia-a-dia, é a perversa e erronia sensação de estanque das idéias. A melancolia da curiosidade.

Não me considero completa. Não é necessário descabelar-se quanto a esse possível erro de minha parte. Não parei os meus questionamentos por considerar-me com conhecimento suficiente para não mais ter o que questionar. O que cresce em mim é um sentimento de outra ordem: o de que não tenho mais nada a dizer. Acabou. Secou a fonte. Sequei.     

Na semana que antecedeu ao carnaval, houve a semana de recepção aos calouros na USP. E ao ver todos aqueles jovens, de rosto pintado e a minha consciência da brancura daqueles futuros, futuros tão livres, não pude conter o enorme sentimento de nostalgia de quando também fui caloura, de quando ainda era “bichete”. Eu tinha o futuro em minhas mãos e ele parecia algo misterioso e maravilhoso. Eu passaria a morar sozinha, em moradia estudantil, na melhor Universidade do país, fazendo o curso que eu escolhi. Eu não iria ter muito dinheiro para as despesas, mas ganharia o suficiente para pagar os gastos com o material da faculdade, com a alimentação e ainda sobrariam uns trocados para passear pelo centro e para pegar uns livros nos sebos da vida. Eu poderia sair a qualquer hora, para onde eu quisesse, e se eu juntasse uma grana, poderia fazer algumas viagens nas férias, à alguma cidade não muito distante. Eu poderia... Às vezes é difícil escapar da frustração em não me enquadrar naquilo que gostaria ter sido e que não fui.

As coisas nestes últimos tempos têm me parecido mais difíceis do que de costume, quase inatingíveis. Por esses dias recebi um e-mail de minha orientadora esclarecendo que avaliará se realmente abrirá uma vaga de mestrado, etc. Eu fiquei meio decepcionada (não, esse não é o único motivo de meu mutismo!), mas ao avaliar bem o comportamento que tive diante dela e o conteúdo de meu projeto, vejo que foi muito educada frente ao caráter do que a ela apresentei: mediano, medíocre. Pois é... Mas o que fazer com as idéias medianas? As minhas ando a deixar todas pela metade. Textos pela metade, projetos pela metade, faculdade pela metade, vontades pela metade.

Esse ano farei 25 anos. A idade que sempre quis ter. Isso por que acreditava que com vinte e cinco anos não haveria ninguém a questionar a “adulteza” de minhas atitudes. Mas vejo que eu estava equivocada. O que eu teimo em ignorar é que quem emprega credibilidade às minhas atitudes sou eu. Porém, acostumada a entregar a finalização de meus projetos a terceiros, realmente ficou difícil a essa altura do campeonato querer voltar ao comando do barco; preguiçoso trabalha dobrado, já diz um certeiro ditado. É óbvio que devo ser sincera e reconhecer o bocado de demagogia que existe na imagem que projeto de mim e dos papéis a que me submeto. Aos silêncios passivos aos quais eu até me felicito em tantas situações onde o direito da palavra era meu.

Por esses dias, me peguei a questionar a minha condição de mãe colocando-a na lista de meus obstáculos. Não que seja inquestionável, mas mais uma vez me vi na frustração em não ser o que os outros gostariam que eu fosse. Não sonhei ser mãe. Preciso ser sincera. Nem sempre tenho paciência. É difícil, é cansativo e às vezes é mesmo muito chato.  Mas daí me envergonhar em ocupar esse papel há uma grande distancia, né? Tive vergonha de ter ingressado à universidade aos 17 anos de idade e ter chegado aos 24 ainda não ter completado o meu curso, não ter adquirido nenhum objeto de valor, não trabalhar no que eu gosto e nem sequer conseguir escrever um maldito projeto de mestrado de 20 páginas. Tive vergonha de ter que mendigar uma vaga no CRUSP à universidade. Mas o que eu liguei sem rodeios a tudo isso, sem o menor pestanejar foi o fato de eu ter me envergonhado de tudo isso e mais a vergonha de já estar com um filho nos braços. Como se todas as atitudes acomodadas que venho mantendo seja conseqüência direta de sua existência! Se tudo é realmente mais difícil com ele, pior ainda comigo.  

E de novo, o retorno ao zero! Às pequenas e nefastas acomodações de cada dia. Agora, sem a criatividade em meu auxilio. Enfim, mais um texto pela metade (só que desta vez, publicado).

 

Imagem: quadro de Salvador Dali, The Persistence of Memory

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Das frustrações...


Algumas imagens realmente mereceriam um registro fotográfico. Mas, privada da capacidade de segurar uma máquina fotográfica, e esquecida das artes do grafite e do nanquim (há anos que deixei de desenhar), restou  apenas, com medíocre utopia, recorrer ao Word que a este momento silenciosamente é quem pode me acolher.

O dia estava nublado e voltávamos de um de nossos passeios à praça do relógio. O vento já dançava em ritmo acelerado e anunciava em nosso rosto o fim da festa, a hora de lavar a casa. Mas a festa nunca tem fim a quem é criança, pois a elas brincar é sempre o mais provável. Por isso, mesmo em fim de passeio, ele ainda corria do mesmo modo com que correu e festejou a nossa partida. De braços abertos, bailava freneticamente ao som das trovoadas. “Mamãe! Mamãe! Vem! Vamos correr atrás dos passarinho”. E desse modo, fui, ao som do vento, enovelada carinhosamente pelas caricias daquela dança. De sua voz e de sua pequenez me brotava uma vontade infinita de eternidade e compulsivamente fui conduzida a abraçá-lo.

A poesia às vezes se materializa (nos poemas eternos dos grandes autores). Às vezes, vira a lembrança de um doce gostoso (não, a minha fotografia escrita, infelizmente, é falha!). Nós sopramos as flores e delas restaram apenas o caule. As pétalas daquela poesia depositaram-se em minha memória, mas não deixaram semente. Assim, resta-me apenas o desejo frustrado de uma fotografia impossível. O invisível de um poema abortado, apesar de toda a poesia que carrega.  Quem sabe, também o despeito de ser a única a saber a ter na memória uma coreografia tão peculiar: de braços abertos, o menino e seus pássaros,  a ventania e o meu tempo. Uma mãe rodeada de infância e um pedaço de seu coração a correr com pássaros e a voar de si.   

 

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Brian Eno - By This River


 

Os créditos da imagem - O fotógrafo- é de Fernanda Magalhães, do blog http://artetransmultiflexmixmultimaga.blogspot.com/